Sensibilização dos Sentidos

Por: Mariangela Damiani – Rio de Janeiro

“O gesto em si nada significa, seu valor reside no sentimento que o inspira, e a dança jamais terá validade, se não tiver calcada em movimentos e emoções humanas”.

(FAHLBUSCH, 1990, p. 35).

Estar constantemente sendo estimulados pelo meio e sofrendo alterações no equilíbrio global, faz com que essa inter-relação do sujeito com o espaço em que vive, exija uma auto-avaliação de seu estado físico e emocional, sendo assim como propõe as questões citadas por Angel Vianna e Jacyan Castilho in GARCIA (2002, p-p. 17-18):

“Responda sinceramente: qual é a primeira coisa que você faz quando chega em casa, após um dia de trabalho (ou mesmo de lazer)? Tira os sapatos e os joga num canto? Desabotoa a fivela do cinto? Troca a roupa suada? Corre pra tomar um gole d’água? Ou deixa a bolsa/pasta num canto, liga a TV e se atira no sofá? Ou ainda lava as mãos do rosto, quem sabe?

É bem provável que você, mesmo não perceba, cumpra algum desses rituais ou outro

qualquer. Seja o que for, pode apostar: a cada vez que você volta para casa, faz alguma

coisa para se pôr à vontade, para estar em casa.. Ou alguém fica de terno e gravata num domingo?!

Pois saiba, caso você nunca tenha pensado nisso, que a sua primeira casa, a que você tem desde que nasceu, muito antes de morar em qualquer outro lugar, é o seu corpo. Uma casa que é só sua, ocupada só por você, da maneira que você bem entende (ou

pode). Você se sente à vontade no seu corpo-casa”?

Observa-se que a Conscientização Corporal, numa relação menos formal e mais livre do movimento, interage e permite que a pessoa renove suas energias já para um maior equilíbrio emocional, além de manter uma harmonia com todo seu entorno.

Em Teatro do Movimento, LOBO (2003, p.61) faz uma reflexão sobre o corpo e nos diz:0018_moderno

“No corpo, circula um fluxo energético, responsável pela presença de algo que transcende a sua materialidade e que chamamos de energia vital. Quando um fluxo energético por qualquer que seja o motivo, fica estagnado em determinados pontos do corpo, prejudica o bom funcionamento do todo, gerando queda de energia, bloqueios emocionais e tensões físicas, que provocam limites nas habilidades corporais e posteriormente causando doenças”.

Sabe-se também que a tensão não é de todo um problema, pois necessitamos dela para nos mantermos em movimento. Porém, o acúmulo de tensão em determinada parte ou articulação do corpo é que vai interromper a fluência da energia, limitando a flexibilidade das articulações, tornando os músculos mais rígidos e criando anéis de tensão. Para BERTAZZO, (1998, p.15): “… o conceito de organização motora pede distribuição do tônus, e não relaxamento. Para ficarmos em pé é necessária uma justa organização muscular”. A própria palavra Dança em todas as línguas européias – danza, dance, tanz, deriva da raiz tan que, em sânscrito significa “tensão”. Para GARAUDY (1980, p.14) “Dançar é vivenciar e exprimir, com o máximo de intensidade, a relação do homem com a natureza, com a sociedade, com o futuro e com seus deuses”.

Complementando o que vem sendo abordado, pode-se afirmar que o corpo é o veículo pelo qual nos expressamos e é através do movimento corporal que as pessoas se comunicam, se interagem, sentem tudo que está a sua volta e essas sensações são percebidas.

Vivemos numa sociedade em que o movimento corporal expressivo não faz parte dos padrões educacionais, assim como FUX (1983, p.93) chama a atenção para o fato de que:

“Quando somos crianças necessitamos mover-nos porque movendo-nos expressamos nossa vontade de rir, de chorar ou de brincar. À medida que crescemos nosso corpo passa pelos tabus de uma civilização que corrompe nossa necessidade de expressão, perde cada vez mais o desejo de mobilização”.

Grande parte dos problemas vivenciados no dia-a-dia é interiorizado deixando registros no nosso corpo. Não só o corpo é afetado, como também o processo emocional, intelectual e os reflexos sofrem esta pressão. Inclusive os bloqueios emocionais acabam interferindo até mesmo na respiração, sem que se percebam os movimentos do cotidiano quase que compulsivamente numa espécie de automatização gestual. Alguns movimentos como: pegar um objeto, se abaixar ou mesmo levantar da cama necessitam de uma organização muscular, organização esta que precisa ser respeitada. BERTAZZO (1998, p.16) nos diz que “… devemos respeitar os biótipos, a reconhecer que determinações genéticas, ação do meio ambiente, educação, influências socioculturais, atitudes de trabalho, traumas de percurso etc, interferem na construção e funcionamento do nosso corpo”.

Nesse sentido, pode-se dizer que cada pessoa é formada de acordo com os estímulos que recebem ao longo de sua existência. Vivências prazerosas contribuem para novas descobertas gerando impulsos positivos que leva o sujeito a autopercepção. “A partir dessa consciência interna do movimento que poderemos então conceitualizar o espaço exterior e estabelecer relação com ele e com objetos e seres que nos rodeiam” (IBDEM, p.23). Desta forma trabalha-se com diversas formas de experimentação, estimulando os sentidos gerando sensações que fortalecem o indivíduo em sua aceitação dentro de uma sociedade produtora de estereótipos físico-corporais em que os valores externos se sobrepõem aos valores morais e éticos.

É importante trabalhar a aceitação do sujeito em relação a seu próprio corpo e a toda sua capacidade criativa, respeitando as relações interpessoais. É neste momento que a dança assume uma importância benéfica no resgate da auto-estima para desenvolver uma maior relação com o seu meio. É muito comum a pessoa rejeitar tocar e ser tocada numa aula ou atividade corporal, onde o expressar-se coletivo exige uma maior relação inter-pessoal. Então, torna-se necessário ampliar os sentidos do corpo, proporcionando maior qualidade nas explorações sensoriais.

Experimentar o prazer do movimento criativo com sensibilidade proporciona benefícios de forma global ao indivíduo. Desta forma, percebe-se que cada atividade pragmática adquire uma nova qualidade na sua forma de manifestação, como no dormir, no acordar e nas demais tarefas do dia-a-dia. Inclusive, LABAN (1978, p.38), reforça a possibilidade de trabalhar com a pessoa, acreditando na sua predisposição evolutiva em relação ao movimento corporal, quando diz que:

“O homem tem a capacidade de compreender a natureza das qualidades e de reconhecer os ritmos e as estruturas de suas seqüências. Tem a possibilidade e a vantagem do treinamento consciente, que lhe permite alterar e enriquecer seus hábitos de esforço até mesmo sob condições externas desfavoráveis”..

Utilizamos primeiramente como estímulos de nossas aulas de conscientização corporal, as dinâmicas de grupo, e podemos observar nessas atividades que os alunos se libertam do seu individualismo, relacionando-se uns com os outros, proporcionando desta forma a integração do grupo e maior desenvolvimento nos trabalhos que serão propostos.

Segundo FRITZEN (2000, p.08):

Exercícios procuram despertar nas pessoas o sentido da solidariedade, adormecidos pelo individualismo e pelo egoísmo. Outros, ainda, buscam mais diretamente uma colaboração efetiva, afastando a frieza, o indiferentismo, a agressividade, o desejo de dominação, o tratamento da pessoa como objeto. Aparecem ainda exercícios que provocam um “insight” pessoal. Apresentam a pessoa como ela é realmente, com suas limitações, deficiências, habilidades, tendências positivas e negativas. Há, enfim, jogos que demonstram maturidade grupal, o grau de abertura de harmonia, e o ambiente de amizade, de sinceridade, de confiança e colaboração.

1098666782_fPara complementar, consideramos importante o enfoque dado por MIRANDA (2000, p-p.13-14), valorizando a dinâmica de grupo na descoberta de si mesmo e do outro, proporcionando uma ação motivadora dentro da educação:

A dinâmica de grupos proporciona aprendizagens diversas aos membros do grupo, tanto no sentido da vivência pessoal (autoconhecimento), como na interpessoal (percepção do outro). (…) A educação com John Dewey, que vislumbrou o preparo dos alunos para a vida social, rompendo com a absoluta tradição de transmissão de conhecimentos e fundando a concepção de professor como líder de um grupo, que influi na aprendizagem, não apenas pelo domínio teórico, mas também pela habilidade de motivar os alunos, estimular a participação e criar entusiasmo.

É desta forma que se constrói uma identidade consciente de suas ações diante do mundo, em relação com o outro para uma melhor qualidade de vida dentro da sociedade atual.

BIBLIOGRAFIA:

BERTAZZO, Ivaldo. Cidadão Corpo: identidade e autonomia do movimento. São Paulo: Summus, 1998.

FAHLBUSCH, Hannelore. Dança Moderna e Contemporânea. Rio de Janeiro: Sprint, 1990.

FRITZEN, Silvino José. Exercícios Práticos de Dinâmica de Grupo. Petrópolis: Ed. Vozes, 2000.

FUX, Maria. Dança, experiência de vida. São Paulo: Summus, 1983.

GARAUDY, Roger. Dançar a vida. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980.

GARCIA, Regina Leite (org). O corpo que fala dentro e fora da escola. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

LABAN, Rudolf. Domínio do Movimento. São Paulo: Summus, 1978.

———————.Dança Educativa Moderna. São Paulo. Ícone, 1990.

LOBO, Lenora. Teatro do Movimento: Um método para um intérprete criador. Brasília:LGE, 2003.

MIRANDA, Simão de. Oficina de dinâmica de grupos para empresas, escolas e grupos comunitários. Campinas: Papirus, 2000.

Mari Gonçales
Professora de Artes Visuais e Dança
2466-4962/9964-7711

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